Finalização de contos
Um conto pode se encerrar através de uma Resolução, que é o final de um
conflito com a vitória de um lado ou de outro. Revelação, que significa a
exposição de algo anteriormente não mostrado. Decisão, que acontece quando o
protagonista resolve algo sobre uma coisa importante e difícil. Explanação, que
, obviamente, provê o final para uma estória sobre um mistério, e Solução, que
fornece o final para um enigma. Vejam a seguir maiores detalhes sobre cada um
destes tipos de finalização
Resolução
Para discutir isto, precisamos falar sobre uma estrutura ideal que é
raramente encontrada de forma completa nos contos. Um nome para isto é
esqueleto da trama. O esqueleto tem cinco ossos:
1. Um personagem central factível e que desperta simpatia do leitor;
2. Seu difícil e urgente problema;
3. Suas tentativas para resolver o problema, que falham e tornam a sua
situação mais desesperada;
4. A crise, sua última chance para ganhar; e
5. A resolução da situação, trazida pelos esforços do protagonista, e
por sua coragem, bom caráter, ingenuidade, etc.
O reverso desta trama é a estória em que o protagonista é o vilão; a
estória termina, em vez de vitória, com sua completa derrota.
“Chuva”, de W.Somerset Maugham, tem um esqueleto de trama completo se
você tomar Miss Thompson como o personagem central. Miss Thompson é uma
prostituta grosseira, forçada a permanecer em Pago Pago, por uma quarentena, no
meio de sua viagem de Honolulu para Apai.
Em Pago Pago, o missionário, Mr. Davidson, ameaça criar problemas para o
governador a não ser que ele a deporte para o continente, onde lhe espera uma
sentença a cumprir. O problema dela é sério e urgente. Ela tenta resolve-lo de
início apelando para o governador e para o Dr.Macphail. Como suas tentativas
falham, ela se rende ao Pastor Davidson e permite que ele salve a sua alma.
Ela se transforma em uma outra mulher, completamente convertida e
transformada. Então, ela seduz Davidson, que corta sua própria garganta em
remorso e horror. No dia seguinte, ela está vestida da velha maneira, e se
comportando como antigamente, com suas
risadas e maneiras escandalosas.
Alguns manuais de escrita insistem que esta é a única estrutura de
sucesso para a escrita popular de ficção mas mesmo que muitos contos comecem
desta maneira, quase que em sua totalidade eles carecem do terceiro elemento
(as tentativas falhas), e do quinto (a vitória do protagonista por seus
próprios esforços ou qualidades).
A terceira é muito difícil de lidar em função do normalmente pequeno
tamanho do conto, e o quinto, porque a repetição de tais finais os torna
comuns, entediantes. Quando uma estória só tem dois finais possíveis, é difícil
surpreender o leitor com qualquer um dos dois; quando a estória só tem um final
tradicional – a vitória do heróis – é mais difícil ainda.
Todavia, a maior parte das estórias com trama são construídas em volta
de algum tipo de conflito ou competição cujo resultado é duvidoso. O início da
estória estabelece os termos da competição; o meio é a competição propriamente
dita; o final traz o resultado. Se isto fosse tudo, as estórias seriam
insuportáveis. Na prática, o que usualmente acontece é que o autor usa a
estrutura de conflito para guiar o leitor numa direção errada – o real sentido
da estória termina por ser alguma coisa completamente diferente.
Conflito pode ser somente uma forma de mostrar o personagem para o
leitor – nós aprendemos coisas sobre pessoas
sob pressão que nós nunca saberíamos de outra forma. Além disso,
conflito é uma conveniente e simples forma de manter o interesse do leitor
enquanto você o guia até seja o que for que você queira, afinal, lhe contar.
Revelação
Note que mesmo na estória de Maugham, que possui um esqueleto de trama
completo, o final não é narrado no local onde deveria naturalmente estar, mas
sim é trazido mais tarde com um ar de revelação. Mais comumente, a revelação
substitui a resolução. Em “O homem do Sul” de Roald Dhal's, por exemplo, a
trama é sobre um pequeno e estranho homem que se oferece para apostar o seu
carro novo contra o dedo mindinho da mão esquerda de um jovem marinheiro. Ele
aposta que o isqueiro do marinheiro não será capaz de acender por dez vezes em
seguida. Ele amarra a mão esquerda do jovem na mesa entre eles com o mindinho
estendido, e aguarda com um cutelo em posição enquanto o marinheiro dispara o
seu isqueiro. No momento em que o marinheiro chega à oitava vez em seguida com
sucesso, a mulher do pequeno homem os interrompe e para com a aposta. Ele não
tem nenhum carro para apostar, ela diz para os assistentes. Ele não tem nada de
fato, porque ela ganhou tudo dele tem muito tempo. Ela avança a sua mão para
apanhar as chaves do carro em cima da mesa e todos podem ver que ela só tem o
polegar e um dos dedos em sua mão.
Veja que ambos os finais a que fomos levados a esperar que acontecessem
seriam desapontadores (o pequeno homem corta o dedo do marinheiro, ou o
marinheiro ganha o carro novo). O conflito com que a estória começa é somente
um truque, uma simulação – a revelação final é o que realmente conta.
Em outras estórias, não há a pretensão de um conflito dramático – o
conto se baseia tão somente em uma revelação. Um exemplo é “A Loteria”, estória
de Shirley Jackson, sobre um ritual ancestral realizado todo ano em uma vila em
Nova Inglaterra. Sorteios são realizados, primeiro por clãs, depois por
famílias, e depois por indivíduos, até que uma pessoa, uma mulher, é
selecionanda. Este processo ocupa quase que toda a estória até os últimos
parágrafos. Somente aí, quando os habitantes da vila começam a jogar pedras na
mulher até a sua morte é que descobrimos sobre o que era a loteria.
Observe que nesta estória, mesmo não havendo conflito no sentido usual,
existe uma tensão crescente porque a escolha vai cada vez mais se reduzindo, e
também porque nós sabemos que estamos cada vez mais perto da revelação do
sentido da loteria. Se você pode criar tensão crescente, não importa se existe
conflito ou não.
Outro exemplo de estoria de tensão crescente sem uma trama convencional
é a estória “Juventude” de Joseph Conrad, sobre um navio sossobrando em uma
tempestade, no qual se poderia dizer que o seu velho capitão tinha um problema
a resolver no sentido do esqueleto da trama, mas o narrador não tinha nenhum –
ele não tem poder de escolha em nenhum ponto da narrativa, exceto ao final,
quando ele pode decidir tentar permanecer perto dos outros barcos, ou sair por
sua própria conta. Inda assim, é o narrador que é a figura central, aquele em
quem nós estamos intensamente interessados; o velho capital é quase incidental.
Decisão
Histórias deste tipo normalmente são sobre interesses ou lealdades
divididas. No conto de John Collier, “O gato de aço”, por exemplo este, um
homem inventou uma ratoeira aperfeiçoada onde o rato era atraído por um caminho
até a isca. Quando estava por pegá-la, o chão cedia e ele caia num recipiente
de água onde se afogava. O inventor esteve por todo o país demonstrando a
ratoeira com o seu ratinho de estimação, mas sem sucesso. Em Chicago ele mostra
o seu invento para um comprador que fica impressionado, mas que desconfia quando
o inventor tenta salvar o seu mascote; ele não acredita na ratoeira até que
veja o rato se afogar. O atormentado vendedor deixa então o seu querido ratinho
se afogar.
O problema com tramas de decisão é que a escolha que o seu protagonista
enfrenta pode parecer muito simples – ou aceitar a oferta de seu amante e ir
viver com ele, ou permanecer em uma relação insatisfatória, por exemplo. O
leitor pode achar que a garota é uma idiota sequer por hesitar – o final vai
ser falho, por ser óbvio. O truque é tornar a escolha realmente difícil, e
evitar que o leitor conheça previamente qual será, afinal, a decisão do
protagonista.
Explanação
Um exemplo é a estória de Nathaniel Hawthorne, “My Kinsman, Major
Molineux” na qual um jovem é mandado para uma cidade na Nova Inglaterra
colonial para fazer fortuna junto a seu parente, o Major Molineaux, um oficial
da Coroa. Ele recebe estranhas respostas em todos os locais por onde busca o
seu parente; homens com vestimentas curiosas estão andando pelas ruas com as
caras pintadas. Um desses diz para o jovem: “Espere aqui por uma hora, e verá o
Major passar”. Passado o tempo, ele ouve o barulho de uma multidão que carrega
tochas se aproximando; no meio deles está o Major Molineaux, em um carro
aberto, pichado e cheio de penas. O mistério está explicado; a estória
encerrada.
Solução
A maior parte das estórias de mistério são realmente estórias com um
final enigmático, sendo que a diferença é que um final misterioso é explicado
por eventos, enquanto que um final enigmático é resolvido pelos personagens.
No livro de Lord Dunsany, “As duas garrafas de tempero”, nós ficamos
sabendo que um assassinato aconteceu, mas ninguém consegue dizer como o corpo
desapareceu. Os fatos são estes: É dito que o assassino é um vegetariano. Ele
comprou uma garrafa de tempero, e depois de seis dias, a outra. Durante as duas
semanas após o desaparecimento de sua vítima, ele derrubou árvores e preparou
tachos de lenha com dois pés de comprimento, mas nunca as queimou. Ele não
abandonou a sua residência após o assassinato; o terreno sob e em volta de sua
casa não foi mexido.
Talvez você tenha imaginado a solução que o detetive amador encontrou
durante a estória. Mas, e sobre as árvores, porque é que ele as cortou? A
resposta é encontrada na última linha:
“Somente – diz Linley – para se divertir um pouco.”
Leitores de estórias de enigmas buscam constante novidade – velhas
soluções não lhes satisfazem. Você provavelmente não deve tentar escrever uma
estória de mistério, a não ser que você goste mesmo deste tipo de literatura e
tenha lido o suficiente para ter ideia do que os outros escritores já
escreveram.
Estórias sobre a chegada de desastres inevitáveis são uma exceção à
regra de que uma estória com trama deve terminar com um final surpreendente de
alguma natureza. Dois exemplos são “Anoitecer” de Isaac Asimov e “Bilenio” por
J.G.Ballard. Em ambos podemos ver exatamente para onde a estória está indo; não
há elemento de surpresa, mas mesmo assim estas estorias prendem a nossa atenção
do mesmo jeito que um desastre natural consegue. Em “Anoitecer”, gente de outro
planeta enlouquece e queima suas cidades quando as estrelas aparecem de dois em
dois milênios. Em “Bilenio”, dois jovens em um mundo super-populado do futuro,
descobrem um apartamento vago e disponível. Luxúria impensável! Eles convidam
seus amigos para dividir o lugar um a um, e vão fazendo divisões do espaço até
que o apartamento fica superlotado assim como qualquer outro lugar.
Algumas vezes, o final inevitável é revertido, como em “Guerra dos Mundos”,
de Orson Wells, por uma solução mágica tão transparente que o sentimento de
inevitabilidade permanece; se não por esta vez, na próxima (Os marcianos vão
nos destruir, ou seja o que for).
Em estórias deste tipo, uma atitude desligada em relação aos personagens
é uma boa coisa; o leitor precisa estar preparado para adotar uma atitude de
observador enquanto os personagens percorrem a estória, assim sem estar
intimamente envolvidos (desastres só são interessantes, quando acontecem com outras pessoas).
Disponível em: http://www.escritacriativa.net/escrita/dicas.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário